Em recentes decisões, planos e seguros de saúde têm sido obrigados a cobrir as despesas de tratamento de fertilização.

A tendência do Poder Judiciário expressa não somente uma conquista da mulher, mas da família, que recebe a proteção da Justiça na aplicação da Constituição Federal, do Código do Consumidor e da Lei de Planos e Seguros de Saúde, dentre outras normas legais.

Num caso do Tribunal de Justiça do Ceará, a mulher, acometida pela endometriose, teve indicação médica de tratamento por fertilização in vitro – forma de reprodução assistida -, mas o seu plano de saúde, alegando exclusão da cobertura, negou o procedimento.

Diante da negativa do plano de saúde, a usuária moveu ação judicial para obter na Justiça o direito de preservação de sua saúde, e ainda de gerar e ser mãe.

Registre-se que a endometriose é uma doença muito comum: afeta cerca de seis milhões de brasileiras e, de acordo com a Associação Brasileira de Endometriose, entre 10% a 15% das mulheres em idade reprodutiva (13 a 45 anos) podem desenvolvê-la, e 30% têm chances de ficarem estéreis.

Pontua-se preliminarmente que o presente artigo visa exclusivamente noticiar decisão que pode beneficiar muitas famílias brasileiras; naturalmente não há, nem de longe, a intenção de adentrar em qualquer especialidade médica ou indicação de cura através de tal procedimento.

A conclusão da Justiça está baseada na premissa Constitucional de proteção aos direitos fundamentais do indivíduo – no caso a saúde –, e ainda de que é inválida a cláusula do contrato que desrespeita o disposto nas Leis 9.656/98 e 9.263/96; estas leis determinam que os planos de saúde atendam às necessidades correspondentes à materialização do planejamento familiar.

Neste ponto destaca-se a lei 9.263/96 que entende por planejamento familiar “o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal”.

Ou seja: o planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde, e inclui a assistência à concepção.

Ao mesmo tempo a Lei nº 11.935 de 2009 alterou o art. 35.c, inciso III, da Lei de Planos e Seguros de Saúde (9.656/98), para incluir na cobertura obrigatória o atendimento a casos de planejamento familiar.

Frise-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo, em caso semelhante, manteve o mesmo entendimento e pontuou de forma contundente que: “de acordo com a lei 11.935, de 2009, a cobertura de tratamentos classificados como planejamento familiar, entre eles a reprodução assistida, é obrigação do plano de saúde”.

Segundo ensinamento de Regina Beatriz Tavares da Silva (Responsabilidade Civil na Reprodução Assistida, Saraiva, 2007, 2. ed.), enquanto a inseminação artificial, consiste na introdução do gameta masculino diretamente na cavidade uterina, a fecundação in vitro é uma técnica realizada em laboratório. Com efeito, no entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo deve ser assegurado à autora o direito de valer-se das técnicas de fertilização, revelando-se abusiva a negativa de cobertura ao tratamento em questão, por violar o comando legal de que cabe às operadores de saúde atender as necessidades referentes ao planejamento familiar, sendo que negar o procedimento constitui “grave afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana, da boa-fé e da função social do contrato celebrado”.

O plano de saúde, nos dois processos citados, foi obrigado a custear o tratamento de fertilização in vitro das autoras, já que acometidas de endometriose e não poderiam engravidar por meios naturais. Abaixo transcrevo alguns trechos das decisões da Justiça:

(…)“… Embora a supra mencionada lei exclua a obrigatoriedade de os planos de saúde custearem a inseminação artificial, o mesmo diploma legal, em seu art. 35-C, inciso III, obriga às operadoras de planos de saúde a dar cobertura aos segurados nos casos relacionados ao planejamento familiar. … A partir da Lei nº 11.935/2009, inteligência do art. 35-C, III, da Lei nº 9.656/98, a fertilização in vitro tornou-se, aparentemente, tratamento de cobertura obrigatória …”

(…)“… Entretanto, embora a supra mencionada lei exclua a obrigatoriedade de os planos de saúde custearem a inseminação artificial, o mesmo diploma legal, em seu art. 35-C, inciso III, com a alteração introduzida pela Lei nº 11.935, de 11 de maio de 2009, obriga às operadoras de planos de saúde a dar cobertura aos segurados nos casos relacionados ao planejamento familiar. … Contudo, conforme estabelece a Súmula 469 do STJ, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. E, sob esta ótica, mostra-se abusiva a cláusula que limita o rol dos procedimentos hospitalares a que tem direito a apelada, negando-lhe o tratamento de fertilização in vitro, prescrito por profissional médico habilitado. 4. Em suma, é de todo inválida a cláusula do contrato que desrespeita o disposto nas Leis 9.656/98 e 9.263/96, as quais determinam que os planos de saúde atendam às necessidades correspondentes à materialização do planejamento familiar, expressão certa da dignidade da pessoa humana. … Diante do exposto, considerando que o artigo 35-C, inciso III, da Lei nº 90656/98, torna obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar, e, também, por me filiar ao entendimento jurisprudencial que vem se firmando em torno da matéria debatida, conheço do agravo, dando-lhe provimento, para, reformando o ato combatido, impor à cooperativa agravada a obrigação de arcar com todas as despesas necessárias ao tratamento da agravante, incluindo a ‘FERTILIZAÇÃO IN VITRO’ …”

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